Documentário vibrante registra importante movimento cultural queer à moda brasileira
Foto: Divulgação
Nas margens da Baía de Guanabara, uma comunidade de jovens resgata e vivencia a cultura dos bailes. Um retrato dos dramas, das performances de voguing e da arte do shade, 50 anos depois do seu início em Nova York. Rio is burning!
A cultura ballroom é completamente importada, tanto que muitos dos seus nomes, títulos e elementos se mantiveram tais quais os originais, mas é bater os olhos (e também os ouvidos) num baile feito no Brasil, e por brasileiros, para sentir que tem uma alma nossa que não se acha em quaisquer outros lugares mundo afora. E é exatamente essa brasilidade no movimento que o espirituoso documentário Salão de Baile vem exaltar.
Confesso que achei os primeiros minutos confusos, bagunçados, muito som, muita voz, muita cor. E embora eu ache que narrativamente a introdução poderia ter sido mais suave, entendi cedo que não há outra forma de se contar a história do ballroom e as histórias de seus personagens sem excesso. São pessoas intensas, são motivações efusivas tanto sociais quanto pessoais. Através de depoimentos e de narrações divertidas e ácidas, o filme costura a realidade dos grupos que frequentam as casas e os bailes no Rio de Janeiro com a história do movimento cultural, e o resultado é uma trama sempre instigante, interessada e interessante de se ver e ouvir. O longa faz questão de deixar explícito como o ballroom é intrinsecamente LGBTQIAPN+ e negro. E essa universalidade periférica gera um espaço comum no texto onde as associações de personagens nacionais – com vozes e trejeitos exclusivamente brasileiros e cariocas – com personagens internacionais funciona de maneira orgânica e bem desenhada.
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O filme consegue mostrar com uma métrica espirituosa a estrutura de um baile, suas modalidades e suas etapas. Todas as cenas de performances e danças são bem amarradas visualmente e apresentam uma musicalidade tão afiada que transporta o público para dentro daquele espetáculo. Mas tão importante quanto, e às vezes tão divertido quanto, é ouvir a emoção de quem encontrou naqueles ambientes e em seus próximos um refúgio, uma propósito e uma vontade de viver que até então não haviam achado em suas origens.
É comum encontrar falas de integrantes de movimentos sociais e culturais como o samba, o hip hop e reggae afirmando que eles são estilos de vida, para além da óbvia manifestação artísticas, e o que Juru e Vitã fazem em Salão de Baile e ilustrar como o ballroom é um estilo, uma filosofia e uma proposta de encarar a vida, seja como prioridade ou seja como válvula de escape da "realidade". É sem dúvidas o Paris is Burning carioca, no melhor e no mais respeitoso dos sentidos comparativos.
Nota: 4/5
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