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  • Foto do escritorHosanna Almeida

Crítica | Barbie

Descubra como o longa sobre a Boneca mais famosa do mundo é também um tópico existencialista de 1h54min

Foto: Divulgação


Há, certamente, alguns pré-requisitos a serem cumpridos para apresentar-se como A Barbie, de acordo com o cancioneiro popular, não é de qualquer jeito que a coisa funciona. E se o assunto em questão for o setor amoroso, o critério aumenta: para tornar-se o pretendente amoroso do bibelô da Mattel é necessário ficar ligado e prestar atenção em todas as condições. Obviamente, a gata inteiraça de 64 anos é diferente e muitíssimo exigente, uma flor delicada demais, cuja cor preferida é o rosa. Tudo isto eu pressuponho que você já saiba, claro. O que você não sabe é que essa querida também tem crises existenciais das mais pesadas. E celulite.


No inventivo screenplay de Greta Gerwig e Noah Baumbach não há segredo. Ou melhor: esse subtexto, que é simultaneamente um metatexto, e é o próprio argumento da coisa toda esconde-se à vista, e da melhor forma possível. E se, na audiência, houver alguém com algum grau de familiaridade com o modo gerwigiano de fazer cinema, poderá identificá-lo rapidamente. O tom satírico, modesto porque entende suas proposições e as executa sem ultrapassá-las desmedidamente, ainda que em Barbie a intensidade seja explorada intencionalmente em todo o seu potencial hiperbólico (seja na mise-en-scène, ou nas atuações borbulhantes e brilhantemente kitsch dos coadjuvantes de alto custo na Barbieland, ou até na entrega honesta de Margot Robbie e sua mulher-boneca sem vagina [!] enfrentando o sexismo e a ansiedade paralisante), e o primeiro principal: o pungente teor existencialista, de formação, que aparece em Lady Bird e Frances Ha. Desta vez, a tarefa é soprar vida, e não obstante a dor faltante do Ser que vêm acoplada à experiência humana, na boneca mais famosa de todos os tempos.


Francamente, não há como executar algo neste grau de densidade emocional sem que pareça um grande ensaio existencialista do Jean-Paul Sartre. Há também uma enorme possibilidade de que o filme seja um grande porre. Barbie, então, inscreve-se na lista de melhores produções do ano (se de todos os tempos, não sei, só o tempo dirá) por um elemento que pessoalmente sinto falta, vez ou outra, neste enorme oceano crescente de produções artísticas excruciantemente realistas: este filme não se leva a sério. É uma comédia repleta de referências que presta tributo a outros longas significativos da história do cinema, adicionando uma pitada de musical out of nowhere, sobre uma boneca que acha seu caminho até o mundo real, não por portais mágicos, não por multiversos, não por toques de varinhas de condão: ela vem, inicialmente, dirigindo um Corvette C1 rosa. E depois andando de bicicleta. E num foguete. E em algum momento num trailer. E depois num barco. E por último com um par de patins que, magicamente, trazem-na para esta realidade assim, sem nenhuma explicação. Como? Não sei. Por que? Porque sim. Não é necessário explicar. É um filme sobre uma boneca, laugh a little!

Foto: Divulgação


E isto não quer dizer que os temas concretos e importantes do filme são tratados com desdém. As temáticas e abordagens feministas, conteúdo recorrente nas produções de Gerwig, são, em Barbie, referência central para as demais discussões do filme. É, portanto, natural e esperado que o longa enfrente certo nível de resistência, sobretudo no que tange ao desenrolar do personagem Ken, que já adianto (sem spoilers), não é vilanizado, mas desempenha um papel referencial às questões-chave tratadas pelo feminismo. Mas, sem armas em riste, o público masculino que desejar assistir ao filme sem demais pré-concepções, será mais que bem-vindo desde que possam, claramente, rir de si próprios, como o filme instiga.


Margot Robbie está deslumbrante e é uma atriz que já provou seu nome e valor na indústria, Ryan Gosling e Simu Liu se atraem loucamente em sua rivalidade símile divertidíssima de acompanhar, Issa Rae brilha diferente em sua, um tanto tímida, participação; Alexandra Shipp lança uma das sacadas mais engraçadas e que certamente garantirá a inimizade de alguns fãs de filme de heroi, Kate McKinnon é a Kate McKinnon — e eu sou completamente apaixonada por ela, portanto qualquer opinião é imparcial —, mas o destaque é America Ferrera em um monólogo executado precisamente, no tom apropriado de um nó na garganta colocado pra fora num só golpe, e o sentimento coletivo de expurgo envolveu o ambiente, numa belíssima entrega.


Na última cena, que encerra o longa mantendo o tom cômico – e não há cenas pós-créditos, não espere por elas –, o recado é um só: recomeço. “Life is not plastic, Barbie. But it is, indeed, fantastic.”


Nota: 5/5

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