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Crítica | Kasa Branca

Foto do escritor: Gabriella FerreiraGabriella Ferreira

Afetos que permeiam a memória

Foto: Divulgação


Nossa vida foi, é e sempre será nutrida e rodeada por afetos, sejam eles entre elos familiares, entre amigos, entre amores e até com nós mesmos. Esses afetos se transformam em atitudes, que viram eventuais memórias na nossa vida. Não poderia começar a crítica sobre Kasa Branca, longa brasileiro que estreia dia 30/01,  sem falar sobre o afeto e de como isso nos afeta e nos atravessa de diferentes maneiras. 


Com roteiro e direção de Luciano Vidigal, Kasa Branca foi inspirado em uma história real e é protagonizado por Big Jaum (Dé), Teca Pereira (Dona Almerinda), Diego Francisco (Adrianim) e Ramon Francisco (Martins). Integram também o elenco, Gi Fernandes, Babu Santana, Roberta Rodrigues, Otavio Müller e Guti Fraga. O longa conta a história de um adolescente da periferia da Chatuba, no município de Mesquita, no estado do Rio, que se desdobra para aproveitar os últimos dias de vida da avó diagnosticada com Alzheimer. Para isso, ele conta com a ajuda de seus dois melhores amigos, Adrianim e Martins, que fazem de tudo para Dé dar o melhor conforto possível para avó Almerinda neste momento final. 


Um dos afetos mais profundos que existem, sem dúvidas, é a relação entre avós e netos, especialmente dentro do contexto do país em que vivemos, onde muitas assumem a criação dos seus netos para que seus filhos possam trabalhar ou não cumprir com suas funções familiares mesmo. É uma realidade cruel e é essa que vemos em Kasa Branca. A mãe de Dé faleceu, o pai é ausente e ele só tem a avó e se ela cuidou dele, ele agora cuida dela já debilitada com os graves sintomas do Alzheimer. É uma relação silenciosa entre os dois, com muito carinho e dedicação que o diretor, Luciano Vidigal, mostra nos mínimos detalhes com uma sensibilidade através do olhar que poucos conseguem entregar. 

Foto: Divulgação


Para muitos, a situação de Dé pode ser um fardo. E em alguns momentos é isso mesmo: ninguém deveria passar por isso sozinho e tão novo. Mas, além de mostrar essa parte difícil, Kasa Branca foca nas relações, nos afetos e na capacidade de encontrar beleza mesmo em meio ao caos de uma vida complicada. E isso se estende não só ao nosso protagonista, mas aos vários núcleos do filme. O afeto permeia do neto pela avó, dos três amigos, da mãe pelo filho, das nossas memórias e tudo é muito verdadeiro e sincero, desde os diálogos até a simplicidade de uma troca de olhares. 


Inserido dentro de um contexto periférico e sem cair no determinismo de outras obras, Kasa Branca celebra o cotidiano, sem explorar o sofrimento, a tragédia ou a glamourização da pobreza. Luciano Vidigal nos mostra a outra face da periferia por meio de uma fotografia sensível e um roteiro sólido, sem o estereótipo de violência, crimes e drogas que muitas vezes é o discurso hegemônico de produções que se passam em favelas cariocas. Essa outra face que Vidigal coloca nas telas é uma face que reluz o companheirismo, a amizade e o amor, desde os seus mínimos detalhes. 


Pensando nos aspectos técnicos, Kasa Branca é muito competente em vários sentidos. Desde a fotografia como a fotografia repleta de plongées até a trilha sonora que reverbera o que é escutado na periferia, o filme entrega o melhor que há no cinema brasileiro nos tempos atuais. Vale destacar também as grandes atuações de todo o elenco, com destaque, claro, para a dupla Big Jaum e Teca Pereira, que são cumplicidade e amor de avó e neto desde os primeiros instantes do longa até a sua conclusão. 


Às vezes é difícil falar de algo que te toca e te gera tantos sentimentos com tanta particularidade. A ausência de memória de Almerinda e a presença da dor de conviver com uma avó com Alzheimer se fazem presentes na minha vida há anos. É um sangrar constante ver um olhar vazio que não te reconhece mais e também não se reconhece mais. É não lembrar sonhos, vivências, memórias, é não ser mais você. E tudo isso é retratado muito bem em Kasa Branca. É sensível e é honesto na medida certa.  É uma ode aos afetos, a viver e a memória. 


Nota: 4.5/5


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