Espetáculo no céu, decepção na terra.
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Produzida por Steven Spielberg, Tom Hanks e Gary Goetzman, os mesmos nomes por trás das aclamadas Irmãos de Guerra (Band of Brothers) (2001) e O Pacífico (The Pacific) (2010). Baseada no livro homônimo de Donald L. Miller, desta vez, o foco está nos aviadores do 100º Grupo de Bombardeiros, que arriscaram suas vidas durante a Segunda Guerra Mundial. Diferente das suas minisséries “irmãs” citadas acima, a HBO largou o projeto de Mestres do Ar em 2013, alegando o alto custo da produção. Os produtores então, encontraram uma nova casa no Apple Tv+, que arcou com os 250 milhões de dólares que custaram os nove episódios, segundo o The Hollywood Reporter. O gasto investido é notório em cada uma das nove partes, mas só isso não é o suficiente para se ter qualidade.
Os showrunners John Orloff e John Shiban tentam guiar seus roteiros pelos ideais de irmandade, coragem, perdas e vitórias, mas da maneira mais rasa possível. Em destaque temos os personagens Major Gale “Buck” Cleven (Austin Butler), Major John “Bucky” Egan (Callum Turner), o Tenente Harry “Croz” Crosby (Anthony Boyle), o Tenente Curtis Biddick (Barry Keoghan) e o Major Robert “Rosie” Rosenthal (Nate Mann). Sim, temos dois homens que se chamam Buck e Bucky, inúmeras piadas – sem graça – com isso e um certo protagonismo pouco merecido. O principal problema aqui é a falta de desenvolvimento dos personagens e estes dois são a prova disso. Em diversos momentos é frisado como eles podem ser amigos se são tão diferentes. Bucky é mulherengo, enquanto Buck só pensa em voltar para sua amada. Bucky é um grande fã de beisebol e apaixonado pelos Yankees, enquanto Buck não liga para esportes. É basicamente isso. São múltiplas cenas de diálogos que parecem muito mais repetições do que evolução. Somente reafirmam o que já sabíamos, mas não aprofundam coisa alguma.
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Cito os dois como exemplo, mas é uma dificuldade do texto como um todo. Um dos pontos altos de se ter uma narrativa de nove horas é justamente criar um vínculo entre o espectador e aquelas pessoas que estamos acompanhando semana a semana. Esta conexão intensifica nossas emoções, mas a minissérie não aproveita bem o seu tempo. Retrata a Segunda Grande Guerra, um dos eventos mais tristes do mundo, então naturalmente o olho enche d’água em um segmento ou outro, mas poderia ser muito mais, principalmente quando quer se vender como uma “irmã” de Irmãos de Guerra (Band of Brothers). Os personagens que chegam mais perto de oferecer alguma complexidade em seus arcos são Croz e Rosie, que trazem alguns questionamentos pertinentes em determinada altura. No entanto, não é nada que já não tenha sido feito antes e de uma maneira melhor no gênero. Boyle e Mann, se destacam também pelas atuações, assim como Turner, que mesmo tendo um Bucky superficial em mãos, possui o carisma necessário. Já Butler, ainda parecia estar na transição de Elvis, e está simplesmente apático. E Keoghan, vale dizer, também é capaz de fazer muito mais do que o que entrega aqui.
Onde o roteiro peca, a direção se sobressai. Cary Joji Fukunaga dita o tom no comando dos quatro primeiros episódios e principalmente nas espetaculares sequências de batalha, onde o senso de urgência e a tensão latente são quase palpáveis. Muito do que é mostrado se passa dentro dos aviões, geralmente ocupados por cinco ou seis soldados e com muita coisa acontecendo tanto ali dentro, como nos céus ao redor, é impressionante como nada fica perdido na nossa visão e a experiência se torna ainda mais imersiva. Ryan Fleck e Anna Boden, Dee Rees e Tim Van Patten se dividem na direção das outras partes (como são intitulados os episódios aqui), seguindo com segurança a linha de Fukunaga. Auxiliados por uma fotografia hipnotizante e um design de produção que faz uma ambientação impecável dos cenários internos e externos, a minissérie é um alento para os olhos, assim como efeitos especiais quase imperceptíveis e uma maquiagem extremamente verossímil. A trilha sonora acompanha a grandiosidade pretendida, portanto nestes aspectos, não há defeitos. Infelizmente não é o bastante para televisão de qualidade.
Na minha visão, há uma tentativa de ser cinematográfica. Não há nada de errado com isso, desde que não se esqueça de um dos pilares centrais de uma produção televisiva: os personagens. Então, se no ar eles são mestres, na terra nós mal sabemos quem são. Os episódios seguem uma fórmula redundante onde um sempre se assemelha ao outro e só é possível diferenciá-los quando os cenários mudam um pouco. E de novo se repetem. Nos quatro primeiros vamos sendo apresentados aqueles homens, sempre com as mesmas dinâmicas, na segunda metade destas quatro horas temos as belas cenas de ação. O artifício do “soldado perdido da frota” é usado de um jeito instigante de início, porém depois é empregado como uma possível reviravolta que pouco surpreende. Há uma mudança quando alguns personagens são presos em campos de concentração, entretanto são vários planos de fuga e pouca execução, até que seja conveniente, e de novo, tudo parece o mesmo episódio. A última hora é tomada por um datado senso de patriotismo norte-americano com músicas tristes e crianças emocionadas. Não há dúvidas que aqueles homens foram heróis, mas se o intuito da minissérie era dar voz a eles para que não fossem esquecidos, fez um trabalho pífio. Ainda passa longe de ser “inassistível”, mas para algo que queria ser lembrada como uma “parente” de Irmãos de Guerra (Band of Brothers), teria que comer muito arroz com feijão. Visualmente rica, mas emocionalmente vazia. Uma pena.
Nota: 3/5
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