Texto mais eloquente e estética lúgubre dão o tom do novo melodrama de Almodóvar
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Ingrid (Julianne Moore) e Martha (Tilda Swinton) eram amigas muito próximas durante a juventude, quando trabalhavam juntas na mesma revista. Enquanto Ingrid tornou-se escritora, Martha seguiu carreira como repórter de guerra e as circunstâncias da vida as separaram. Após anos sem contato, elas se reencontram em uma situação extrema, porém estranhamente doce.
Mudanças nem todas são positivas, mas louvo a ousadia lúdica de quem constantemente está aberto a novas tentativas, sejam grandes ou pequenas, de sair do seu lugar comum. Almodóvar sempre foi um cineasta que soube mesclar a plástica e a narrativa em filmes facilmente identificados seja pelo tom dramático quase novelístico do roteiro ou pelas cores saturadas que iluminam suas cenas como pinturas modernistas. No entanto, na última década o premiado diretor vem se mostrando aberto a arriscar alterações seja na estrutura técnica ou na linguagem do roteiro.
A diferença mais enfática de O Quarto ao Lado para as outras produções de Almodóvar é ser seu primeiro longa-metragem em língua inglesa – o diretor já havia feito dois curtas-metragens no idioma, A Voz Humana (2020) e Estranha Forma de Vida (2023) – e incontestavelmente isso acarreta algumas consequências no produto, afinal estamos falando de um roteirista com mais de 40 anos de carreira e que, entre comédias e dramas, se consolidou com um dos principais contadores de histórias filmadas em seu idioma original. Não à toa este é seu trabalho mais eloquente, mais direto, os diálogos preferem atalhos a passeios estilísticos e até mesmo as analogias textuais são mais límpidas.
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Para além disso, as outras mudanças e diferenças estão intrinsecamente ligadas ao arco principal do argumento. A história é a especialidade da casa, um melodrama cheio de problemas maternos, tensão afetiva, desejo reprimido, culpa católica entre outros temas bem conhecidos de Almodóvar, no entanto o filme quase não apresenta o cinismo jocoso que o diretor tanto gosta. Saindo das coloridas cidades da Europa para um Nova Iorque gélida, com cores opacas e de matizes acinzentadas, a estética já entrega um pessimismo que vem a ser confirmado nas falas, nas intenções e na falta de esperança coletiva dos personagens. Somado aos tópicos já citados, o texto ainda cutuca crise climática, liberalismo econômico, conflitos internacionais, baixa expectativa de vida entre outros problemas que são causados pelo ser humano pós-moderno e que colocam prazo de validade em sua existência enquanto espécie.
Julianne Moore e Tilda Swinton executam com suas personagens com precisão milimétrica de sutilezas e constroem em cena uma relação sensível e cheia de entusiasmo (mesmo diante da situação das personagens). A história se molda ao redor das duas amigas, mas é filmada com tanta leveza que até nos planos mais fechados não as sufocam ou pressionam, tanto as atrizes quanto as personagens. Ambas parecem estar sempre à vontade e apreciando cada segundo de troca entre elas, o que constitui a maior parte do filme.
Pedro Almodóvar não deixou de lado o cinema poético, mas agora, pelo menos aqui, ele parece estar bem mais interessado em explorar o seu cinema prosaico, embora ainda falte ritmo ao ligar os momentos. Mais uma vez, admiro a vontade de experimentar e mudar por menor que seja, e isso apenas faz de O Quarto ao Lado uma produção relevante, mas aí vai do gosto do cliente quanto ao resultado, eu prefiro os exageros, mais analogias visuais e menos verbais, e a fluidez com que ele já estava acostumado a trabalhar, pelo menos por enquanto.
Nota: 3,5/5
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