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Crítica | Oeste Outra Vez

Foto do escritor: Ávila OliveiraÁvila Oliveira

Atualizado: 24 de mar.

Erico Rassi cria retrato sensível e áspero de um universo masculino desgarrado.

Divulgação


No sertão de Goiás, homens rudes e incapazes de lidar com suas próprias fragilidades são constantemente abandonados pelas mulheres que amam. Tristes e amargurados, eles se voltam violentamente uns contra os outros.


Em seu primeiro longa-metragem, Comeback (2016), o cineasta Erico Rassi já havia mostrado sua afeição ao gênero western bem ao seu estilo. O cenário quase sempre vazio rimando o estado “espiritual” de seus personagens, as poucas e monossilábicas palavras, o machão cheio de sentimento reprimido. E em Oeste Outra Vez ele expande essas alegorias para mais personagens e mais paisagens autóctones com uma narrativa direta, mas cheia de subtexto.


A começar pelo título brilhante que referencia o gênero, referencia o Centro-Oeste brasileiro e acaba por ser também uma auto referência retomando o seu primeiro longa. Rassi transfere a tensão constante dos filmes de bangue-bangue para um contexto bem nosso (e por nosso cabem: brasileiro e masculino). O longa gira em torno da mulher, da presença feminina que aqui vira ausência feminina. A macheza revestida de fragilidades substitui o excesso de confiança e propósito dos protagonistas dos clássicos spaghettis. A tensão se constrói também em cima da falta de diálogos, na produção, o silêncio comunica tanto quanto – e às vezes mais do que – as falas. Existe a necessidade palpável de externalizar sentimentos, de verbalizar palavras de dor, afeto, e raiva, mas homem que é que homem não fala, não chora, não encosta, quase não sorri, e só sente porque é involuntário.


Oeste Outra Vez também deixa à mostra o papel da mulher naquela realidade, como um acessório, seja de troféu pela conquista de micropoder entre os homens, ou seja como uma medalha de honra porque ter conseguido ter alguém para passar o resto dos seus dias, “uma mulherzinha para fazer companhia”. O texto de Rassi também brinca com um humor duro e quase involuntário existente entre seus personagens mal resolvidos, uma ironia presente na eterna e cordial guerra fria de egos rivais almejando a mesma meta: uma dignidade que só existe no plano das ideias. Interessante é ver também como aqueles homens trabalham sua codependência no trabalho e na socialização, “é bom ter uma pessoa por perto que é um ajudando o outro” é a forma mais próxima de demonstrar o apreço pela amizade, mesmo marcado a ferro quente pelos parceiros de trabalho eles são como família onde “um cuida do outro”, e onde cuidado significa meramente a manutenção básica da vida. 

Divulgação


A direção é impecável, o filme é enxuto, bem distribuído, com uma montagem limpa e precisa que cria a dinâmica natural e diluída da narrativa. A imagem é rica em sua simplicidade, é um trabalho bem iluminado, bem enquadrado, bem desenhado em uma cenografia que altera entre os planos abertos e iluminados das chapadas goianas e os ambientes fechados e escuros de bares e casas populares. O desenho de som translúcido também ajuda a compor a aclimatação das paisagens do longa.


Erico Rassi é goiano, e talvez por essa razão óbvia e outras questões subjetivas o oeste escolhido tenha sido aquele, mas é uma história tão universal, é uma abordagem tão cirúrgica e são temas tão pertinentes que, completando o que falei no início, o argumento seria facilmente adaptável para qualquer interior do país e certamente de vários outros lugares do mundo, afinal, homem, machismo e patriarcado existem onde quer que seja, e os parâmetros são de mal a pior.


Nota: 5/5


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