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Foto do escritoroxentepipoca

Crítica | Reservation Dogs (2ª temporada)

A nova leva de episódios eleva o já altíssimo nível da série

Divulgação: FX


Uma grata surpresa do ano passado, 'Reservation Dogs' finalmente retorna com novos episódios no Star+. A temporada começa praticamente onde a passada terminou, com Elora (Devery Jacobs) abandonando Bear (D’Pharaoh Woon-A-Tai) e partindo para a Califórnia com Jackie (Elva Guerra). Willie Jack (Paulina Alexis) e Cheese (Lane Factor) tentam confortar o amigo, enquanto também estão magoados com Elora. A dor da perda de Daniel (Dalton Cramer) ainda reflete na maioria dos personagens e nas atitudes que os movem. Se na temporada anterior Bear e Elora tinham um protagonismo maior, nesta eles dividem mais os holofotes com Willie Jack e Cheese. Não que eles tenham ficado de lado, porém, todos têm seus momentos de destaque e o texto aprofunda melhor cada um deles. O amadurecimento é o foco dos novos episódios, e o roteiro trabalha isso de uma maneira brilhante, dosando perfeitamente humor e drama.


Nos primeiros episódios, acompanhamos Elora e Jackie na tentativa de chegar à Califórnia, se metendo em várias enrascadas, como esperado. É uma delícia de se assistir, enquanto a amizade das duas vai se desenvolvendo e se tornando uma das melhores da série. Apesar dessa nova amiga, Elora não consegue se esquivar da culpa de deixar Bear, mas ainda julga que fez o certo. Quando um acontecimento a faz retornar à reserva, ela precisa mais do que nunca do apoio de todos. Eles estão lá por ela, mas ainda há uma barreira no grupo e algumas coisas precisam ser ditas. A dinâmica gera conflito entre eles, o que é bem interessante de se acompanhar. Não há lados corretos, há jovens que erram e acertam e há um forte laço de amizade que ainda pode ser atado novamente. Devory James já havia mostrado seu talento na temporada passada e nessa ela confirma a que veio. A moça é um achado, assim como a maioria do elenco. Bear se sente abandonado, Willie Jack se sente traída (principalmente pelo fato de Elora ter ido embora com Jackie, uma suposta inimiga) e Cheese é o Cheese, que só quer que tudo e todos fiquem bem.


Bear tem que lidar com o fato de ser deixado mais uma vez, antes por seu pai e por Daniel (como ele mesmo questiona) e agora por Elora. Ao longo da temporada, ele vai ganhando mais maturidade para lidar com as situações, seja no trabalho ou no eventual retorno de Elora à comunidade. O rapaz passa a trabalhar em uma construção ao lado do pai de Daniel. Em uma belíssima cena, os dois conversam em cima de um telhado enquanto o sol se põe, sobre a perda de Daniel. Os diálogos, a direção, a fotografia, tudo colabora para a perfeição, mas a atuação deles, e principalmente de Woon-A-Tai, eleva tudo a outro patamar. Os conflitos e dores do personagem estão expostos ali, tudo dentro de um garoto de tão pouca idade que não deveria ter que lidar com tanto.


Willie Jack tem um dos melhores arcos da temporada, onde Paulina Alexis tem a chance de brilhar. Sem papas na língua, ela fere e ajuda na mesma medida, o que só dá à personagem mais camadas e complexidade. Quando uma professora entrega uma carta de Daniel a ela, em um dos melhores episódios do ano, não só da série, a jovem decide ir visitar a mãe de Daniel na prisão. A trama emociona e evoca fortemente a ancestralidade nativo-americana deles de uma maneira genuinamente bonita e tocante. É simplesmente de arrepiar. A cena é forte, cheia de diálogos impactantes que ressaltam a dor das personagens, bem dirigida e com atuações fantásticas. Como na temporada de estreia Willie Jack era responsável por boa parte do humor, aqui ela ainda é, mas trazer mais dramaticidade para sua história dá mais densidade a ela e mostra a versatilidade de Alexis, que passeia facilmente entre as tiradas cômicas e os momentos mais emotivos.


Cheese, que é um poço de carisma, prefere o bem-estar de todos e sem se importar com ele próprio. Em um dos episódios, o menino é preso em um tipo de detenção para menores. Não só o episódio nos mostra bem mais do personagem, de como ele é inteligente, ainda que enxergue o mundo com uma certa inocência, mas também da amizade e de como ele é importante para o grupo, quando eles aparecem para resgatá-lo. O mais surpreendente? Cheese se recusa a ir e escolhe esperar. Não é tão surpreendente assim, porque passamos a conhecer ainda mais dele e sabemos que ele, geralmente, escolhe fazer o certo. Se os outros três principais são mais conflituosos em suas escolhas e nem sempre escolhem fazer o mesmo, ainda que saibam que podem machucar alguém, em Cheese vemos esse contraponto, de alguém que teima em se importar com o próximo e ter empatia. A empatia por ele é verdadeiramente é recíproca, pelo menos do ponto de vista de telespectador.


O fato de a temporada ter dois episódios a mais do que a anterior, ajuda a coadjuvantes ganharem mais tempo de tela, como no ótimo episódio que foca na mãe de Bear e suas amigas. Imagino que muita gente não vá gostar dele por tirar o foco dos jovens. Mas é tão divertido, parece um filme bacana da Sessão da Tarde com um bocado de comédia. No entanto, essa meia hora ainda tem uma boa dose de drama, que desenvolve as personagens e nos ajuda a entender mais sobre elas e as suas relações com seus parentes mais jovens. O oficial Big (Zahn McClarnon), assim como no ano anterior, também tem seu episódio de destaque. É divertido, mas é de longe o que menos gostei, devo dizer.


É inegável que eu adoro séries adolescentes, mas há uma parcela da população que ainda vira o rosto quando elas são o assunto, apesar da qualidade de várias delas. Ainda assim, muitas fazem um sucesso estrondoso, como ‘Euphoria’ (HBO Max), ‘Sex Education’ (Netflix), ‘Elite’ (Netflix), para citar só alguns exemplos atuais. Assisto e gosto de todas, ciente de suas qualidades e defeitos, mas nenhuma delas consegue fazer o que ‘Reservation Dogs’ faz. Em termos de qualidade, para mim, essa temporada só perde para a última de ‘Better Call Saul’ como uma das melhores do ano.


Hoje em dia, o gênero é muito mais inclusivo do que já foi em meados dos anos 1990 ou 2000, mas a representatividade nativo-americana era pouquíssimo explorada até então. ‘Reservation Dogs’ chega com uma equipe talentosíssima de indígenas americanos por trás e na frente das câmeras, contando histórias belíssimas, emocionantes e engraçadas. A 2ª temporada pega tudo que deu certo na já excelente 1ª e eleva o nível do jogo, aprofundando seus personagens e suas raízes, em 10 incríveis episódios de pouco mais de 30 minutos (às vezes até menos), tudo isso embalado por uma trilha sonora para ninguém botar defeito. Sterlin Harjo e Taika Waititi sabem onde querem levar a narrativa e como chegar lá. Contar a história de descendentes de povos originários não é uma tarefa fácil e eles o fazem não só com uma trama extremamente atual, mas que honra suas origens e é um deleite de se acompanhar.


Nota: 5/5

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